MEU ROMANCE

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O DIA QUE NGOLA DESCOBRIU PORTUGAL

ESCRITOR & PROFESSOR


domingo, 27 de setembro de 2009

A FORMIGA E A CIGARRA

Era uma vez uma formiga e uma cigarra que eram muito amigas... Durante todo o outono a formiga trabalhou sem parar, armazenado comida para o inverno. Não aproveitou o sol, a brisa suave do fim da tarde, nem de uma conversa com os amigos a tomar uma cervejinha depois do dia de trabalho. Enquanto isso, a cigarra só andava cantando com os amigos nos bares da cidade, não desperdiçou nem um minuto sequer com o trabalho, cantou durante todo o outono, dançou, aproveitou o sol, desfrutou muito sem se preocupar com o mau tempo que estava para vir. Passados uns dias começou o frio, a formiguinha, exausta de tanto trabalhar meteu-se na sua pobre guarida cheia de comida até ao teto. Mas, alguém a chamou da rua e quando abriu a porta teve uma grande surpresa quando viu sua amiga cigarra num Ferrari e com um valioso casaco de peles.

A cigarra disse-lhe:

- Olá amiga! Vou passar o inverno em Paris. Podes cuidar da minha casinha?

A formiga respondeu:

- Claro! Sem problemas. Mas o que aconteceu? Onde conseguistes o dinheiro para ir a Paris, como comprastes esta Ferrari, e este casaco tão bonito e caro?

E a cigarra respondeu:

-Imagina lá, que eu estava cantando num bar a semana passada, como de costume, e um produtor gostou da minha voz... Assinei um contrato milionário para fazer shows em Paris! A propósito, precisas de alguma coisa de lá?

- Sim, - disse a formiga.

Se te encontrares com LA FONTAINE (autor da fábula original) manda-o à merda, da minha parte!

Tem-se presente que as relações de trabalho e o próprio trabalho em si, por um lado, humanizam a natureza, geram riquezas e socializam as pessoas; por outro lado, contudo, em muitos casos, também as degradam e fazem sofrer. Esse paradoxo é revelado de forma mais clara quando se apercebe que o trabalho libera e oprime, ou seja, que é desejado para satisfazer necessidades básicas e de consumo, mas que nem sempre aquele que trabalha mais vive melhor e tem seus sonhos de consumo concretizados! Aquela coisa de que o trabalho dignifica o homem e o enriquece nos faz “formiguinhas”. Geralmente as “cigarras” da nossa sociedade sempre se saem melhor que as “formiguinhas” da vida!

Assim, sabe-se que o (trabalhador) brasileiro fica - por força de relações de trabalho - privado de incontáveis momentos do seu tempo e/ou, às vezes – mesmo como dono do seu tempo – lhe faltam condições para dele usufruir, apesar de seu reconhecimento constitucional. Essa questão é fundamental, haja vista que tanto o trabalhador como o ser humano em geral têm necessidades vitais não apenas materiais, mas também imateriais, e a criação, o sonho, a alegria, o prazer, a felicidade – considerados componentes do tempo livre como lazer – são essenciais para a vida digna. Ressalta-se que a proteção a esse tempo livre conhecido como lazer está inscrita, no Brasil, na Constituição Federal de 1988, no Capítulo II do Título II, que trata dos direitos sociais. Assim, o artigo 6º menciona que são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a providencia social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados. A palavra trabalho vem do latim tripalium, instrumento de tortura - instrumento constituído de três paus ou estacas com pontas de ferro utilizado pelos agricultores para baterem o trigo, as espigas de milho... Trabalho significou por muito tempo - ainda conota – algo como padecimento e cativeiro. Moral da história: Aproveita a vida, trabalha, diverte-te em proporção, porque trabalhar demasiado, sem lazer e às vezes sem o devido reconhecimento só traz benefícios nas fábulas de LA FONTAINE!

In "Palmensis Mirabilis" de João Portelinha