MEU ROMANCE

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O DIA QUE NGOLA DESCOBRIU PORTUGAL

ESCRITOR & PROFESSOR


quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Pintura da minha mãe -1994

CRÍTICA DE ARTE EM TOCANTINS

A crítica de arte é uma atividade que integra a produção cultural há milênios. Não é uma atividade recente como muita gente pensa. Petrônio era tido como um ditador de modas e gostos na Roma imperial do primeiro século depois de Cristo, ou pelo menos apresentava-se como tal. Terminou seus dias cortando os pulsos, por ordem do imperador, talvez insatisfeito com atitude blasé. Desde então, a critica de arte fez gloria ou desgraça de mais de um intelectual. O nosso problema em Tocantins é que os críticos de literatura querem ser de artes plásticas, de cinema, teatro e vice-versa...

Quem critica se expõe! Além de um saudável ceticismo, na medida em que haverá a permanente suspeita de que seu parecer seja meramente opinativo, o crítico enfrenta, não raro, reações destemperadas e bate-bocas, pois a boa crítica é expressa de forma contundente e irá alegrar alguns e magoar outros, por razões emocionais ou financeiras. E se uma obra receber uma avaliação desfavorável vier a ser um sucesso de público, ou vice-versa, haverá os tapinhas nas costas, as ironias e as comparações de sempre sobre falta de sensibilidade dos críticos para colocar o temerário (ai dele!) em seu devido lugar por uns dias. E as reações podem ir mais além. Críticos de arte são postos na berlinda da mídia de tempos em tempos. Pretenso artista frustrado, erudito estéril, destrutivo e irresponsável, as calúnias despejadas sobre analistas de reconhecida competência, sensibilidade e preparo técnico apenas ilustram os sentimentos que o critico suscita junto a artistas, produtores e ao público em geral. É por essa razão ou razões que os críticos tocantinenses quase sempre são “puxa-sacos” e muito favoráveis! Em lançamentos de livros que participei os autores são quase sempre considerados “expoentes máximos da literatura nacional”. Uns comparados a Machado de Assis... Alguns estreantes e com obras aparentemente triviais chegam a ser mesmo comparados a Fernando Pessoa e na pintura, a Picasso! Por outro lado, quem escreve, pinta, borda, faz escultura ou qualquer outro tipo de arte sempre se expõe. É normal nestes casos receber críticas, algumas até indesejáveis... Aí o cidadão se sente ultrajado com as críticas. A não ser que encerre tais obras num lugar herméticante fechado! Mas, mesmo assim, correria o risco de sua família e amigos, ao verem tais obras, opinarem sobre as mesmas! No entanto, queiramos ou não a critica de arte ou, em caráter mais geral, a curadoria, é indispensável. O curador é parte de um establishement que dá ao artista uma dimensão da sua proficiência técnica, da aceitação do seu trabalho e do significado social de que se reveste. Oferece ao público, ou a segmentos específicos de consumidores, um parecer alternativo sobre a obra, muitas vezes esclarecendo aspectos que ficam obscuros para quem não conhece o lado artesanal e técnico do trabalho ou não logra situá-lo histórica ou socialmente. E tem a função de estabelecer alguns parâmetros de aceitabilidade para obras que, embora relevantes para a sociedade, estão no limiar da rejeição por agredirem o bom gosto ou as convenções usualmente admitidas e que, sem um aval de autoridades reconhecidas, seriam condenadas à indiferença.

Há um preço a pagar, um outro lado da moeda, dado pela aceitação na sociedade de uma divisão do trabalho artístico entre artista, que concebe e produz , o curador, que seleciona, agrupa, divulga, traduz ou interpreta socialmente o trabalho do artista, e o marchand, que o coloca no comércio. Nessa organização econômica da cultura, o artista assume o papel da produção braçal, mas os instrumentos que dão substância social à sua obra são colocados pela sociedade nas mãos da curadoria e do comércio. O mercado seria, portanto, redutor do papel do artista. A impressão que eu tenho é que as coisas não funcionam assim em Tocantins... O artista quer que os presidentes das fundações culturais comprem suas obras! Como se a atividade das fundações culturais se consubstanciassem apenas em serem meros compradores de suas obras! O poder público não tem essa obrigação! E quando isso, eventualmente acontece, como é obvio, a obra comprada enquadra-se em uma linha de trabalho especifica; estilo, escola ou movimento... Os demais artistas, com estilos diferentes e que não se encaixam na temática da exposição, sentem-se totalmente marginalizados (é o que acham) por suas obras serem “preteridas” naquele momento... De certa maneira, acostumamo-nos a um Estado paternalista que obviamente já não existe mais...

In “Palmensis Mirabilis”, Jornal O Estado, 19-11-09