MEU ROMANCE

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O DIA QUE NGOLA DESCOBRIU PORTUGAL

ESCRITOR & PROFESSOR


domingo, 25 de outubro de 2009

AUTORIDADE OU LIBERDADE?

Assisti nestes últimos dias quase todas as palestras sobre educação ministradas por ilustres e diversos especialistas em educação. Apercebi-me, também, pelas questões apresentadas na ocasião pelos pais e professores que a preocupação maior seria se os organismos que se propõem cuidar da educação dos nossos filhos deveriam ter mais autoridade ou não. De fato, muitas vezes hesitamos, assumimos posições contraditórias e oscilamos de um comportamento para o outro. Na realidade, os pais sentem cada vez mais sua autoridade contestada, já não sabem se a devem abandonar ou acentuá-la. Apercebem-se da inadequação das modalidades anteriores da sua presença, mas não descortinam que modalidades novas as devem substituir. Em suma, pensam dever escolher entre a autoridade e a liberdade. Por conseguinte, para clarificar o “problema do melhor comportamento”, há que elucidar estes dois conceitos.

Aquilo a que se chama atitude autoritária é fácil de definir. É a que atua por coação, independentemente das suas modalidades, as quais variam em função dos países, épocas e, sobretudo, costumes de grupo, dos meios socioeconômicos e profissionais, da personalidade e da psicologia dos pais. Será, pois, mais ou menos regressiva, consoante os casos, e recorrerá a diversos tipos de sanções. Mas implica sempre que o pai exerça a sua “soberania” e não se preocupe com a adesão dos filhos às suas estipulações.

Aquilo que se designa por atitude liberal é igualmente simples de definir. É a que evita a imposição e busca a adesão. Mas pode exercer-se de formas muito variadas: entre a simples busca de uma atitude benevolente, que se esforça por evitar as sanções, e o extremo de uma posição libertária, há uma infinidade de graus e variantes. A própria “autodisciplina” envolve uma multiplicidade de modalidades possíveis. Se o principio é claro, as realizações resultam demasiado diversas para que a utilização imprecisa da expressão permita saber sob a que comportamento concreto corresponde.

Há que se acrescentar que a situação recíproca destas duas tendências é muito paradoxal. Com efeito, a atitude autoritária foi e continua sendo constantemente criticada. De Rabelais e Montaigne até à psicologia contemporânea, as suas insuficiências e perigos foram demonstrados com clareza. No entanto, apesar dessa argumentação, não foi adotada ou degenerou num abandono no qual alguns autores vêm a fontes de muitos males da nossa sociedade e tentam então reabilitar uma atitude autoritária. Ora, em todos esses debates, o problema é colocado em termos de escolha. Opõe-se uma educação pela liberdade e uma educação pela autoridade, como se uma e outra se excluíssem. Assiste-se a uma oscilação que leva, consoante os casos, a preferir uma à outra, e verifica-se o malogro de ambas. A meu ver, existe aí um erro de método, tanto do ponto de vista teórico com prático. Na verdade, na educação não se deve escolher entre liberdade e autoridade, mas sim entre tipos de autoridade e tipos de liberdade. Assim, a autoridade pode ser tirana, representando fraqueza, modo que certas formas de liberalismo. Estas duas formas de fraqueza encontram-se, por vezes, em momentos diferentes, no mesmo educador. Ao invés, existe uma forma de autoridade que emana do prestígio e, nessa medida, é suficientemente forte para reconhecer zonas de liberdade às crianças e adolescentes. Analogicamente, a liberdade pode ser concedida a estas. De forma gradual e deliberada, com fins lucidamente educativos. Pode também ser uma forma de abandono, de desinteresse a seu respeito, apresentar-se como solução de facilidade e provir então da negligência. Há, pois, diversas formas de autoridade e liberdade que se devem distinguir e analisar. Contentarmo-nos em opor os dois termos é superficial e enganador. É por isso que muitos debates educativos se mantêm verbais e insignificantes. Opõem-se conceitos que não têm a mesma significação para todos os interlocutores: há, portanto, que ultrapassar essa oposição. De resto, ninguém vive impunemente as delícias dos extremos, como eu costumo a dizer...

In “palmensis Mirabilis” de João Portelinha

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