MEU ROMANCE

MEU ROMANCE
O DIA QUE NGOLA DESCOBRIU PORTUGAL

ESCRITOR & PROFESSOR


sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Momentos da minha Juventude

Posse de novos membros da Academia Palmense de Letras II

Autorga de membro da APL à Boaventura Cardoso

Posse dos novos Membros da Academia Palmense de Letras da qual presido

Actividade literária de João Portelinha em Brasília

Poemas de João Portelinha

Lançamento do Romance de João Portelinha por ocasião do 35° Aniversário da Independência de Angola na Embaixada de Angola em Brasília

Lançamento do Livro "Crónicas de Risos e Lágrimas" de João Portelinha em Brasília

Casamento da da Helga Portelinha, filha de João Portelinha em Luanda no Futungo de Belas em Julho de 2010

Viagem de João Portelinha ao sul de Angola e palestra na Universidade Eduardo dos Santos no Huambo

Vídeo do lançamento do Livro de João Portelinha na Universidade Federal do Tocantins

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Cidadã Tocantinense, Dona Margarida é homenageada em Tocantínia

Com o apoio do governo federal a Prefeitura de Tocantinia na pessoa do prefeito Manoel Silvino Gomes Neto (PR), inaugurou num anexo da prefeitura, a Biblioteca Municipal Margarida Gonçalves nesta quinta-feira, dia 9 de dezembro. Dona Margarida, 83 anos, foi homenageada em vida pelo trabalhos prestados e porque veio para as margens do Rio Tocantins, em 1948, com 21 anos, como Missionária Batista da Junta de Missões Nacionais da Convenção Batista Brasileira. Embora aposentada, ela continua como missionária da junta, prestando serviço na cidade de Lajeado. A homenageada foi diretora do Colégio Batista de Tocantinia por quase 40 anos. Lecionou no Colegio Batista de Santarem, no Pará, no Instituto Batista de Carolina, Maranhão. Também foi diretora do Colegio Batista de Palmas.
Dona Margarida estudou no Baptist Seminary Fort Worth, Texas, Estados Unidos. Ela também ocupa a Cadeira 22 da Academia Tocantinense de Letras. Cidadã Tocantinense, título concedido pela Assembleia Legislativa do Estado, Dona Margarida escreveu o livro "Beatriz a Que Faz Feliz" (Rio de Janeiro, Juerp, 1980); Facetas da Vida Cristã (Palmas, Provisão, 2007). Na inauguração da Biblioteca, em Tocantinia, estiveram presentes figuras ilustres, entre as quais, Pastor Samuel (do Rio de Janeiro, representado a Junta de Missões Nacionais), Eduardo Almeida (presidente da Academia Tocantinense de Letras), Mario Ribeiro Martins (procurador de justiça aposentado e membro da ATL), João Portelinha (presidente da Academia Palmense de Letras), Osmar Casa Grande (da Academia Palmense de Letras), o Pastor Claudio, além de centenas de outras pessoas

SOLIDARIEDADE MASCULINA AO EXTREMO




Eurípides disse, certa vez, que era melhor estar três vezes em combate com escudo e tudo que parir uma só vez!
    Se a gravidez é felicidade para a mulher, já não se pode dizer a mesma coisa do parto, que é complicado, sobretudo pelas dores que aumentam de intensidade, sendo, em princípio, espaçadas, reduzindo-se pouco a pouco os intervalos quanto mais se aproximam de seu término. Às vezes, para desgraça destas, o parto é acompanhado com eclâmpsia, que se manifestam por perturbações visuais e cerebrais, dores de estômago e, finalmente, tremores nos músculos da face, pálpebras e lábios, etc. Quer dizer, “dar à luz” não é fácil! Não é por acaso que as mães para suas filhas que, quando forem mães, saberão certamente o que é ser MÃE. Mas o meu propósito aqui não é alarmar ninguém sobre a “condenação” da mulher apregoada em Madéias: - Engendrarás na dor, disse Deus à mulher. Nem tão pouco fazer um tratado de medicina.
         Em toda história da humanidade, sempre se pensou acabar ou pelo menos amenizar as dores de parto. E sempre também questionou-se o papel masculino, a participação do homem na geração da prole e a possibilidade de alguma solidariedade masculina para as parturientes.
         Entre os índios, de acordo com o meu amigo Eustáquio Grillo, docente da UnB, na altura em que a índia está de resguardo, o esposo fica de resguardo também, podendo ser até mais radical, ou seja, mais próximo do repouso absoluto. Isto, segundo o ilustre docente, talvez seja conseqüência da crença de que a boa gestação exige, digamos, o continuo fornecimento de matéria-prima! O que, no caso, significa esperma e, por isso, implica manter relações sexuais diárias com a esposa grávida. Não é uma forma de solidariedade masculina?
         Nas aldeias africanas, a gravidez é também um período carregado de tabus e mistérios. A grávida é influente e tem toda solidariedade e carinho, não somente do marido, mas de toda comunidade. Aqui o curandeiro dispõe de um aparato de variadíssimos recursos assistenciais e mágicos para libertá-la de um parto com dor. O engenho dos especialistas da magia parece tão inesgotável e variado que incluem no seu bojo uns tantos milongos para a transferência das dores para o marido.
         A minha irmã Etelvina resolveu a passagem da dor para o marido na hora. Quando estava a ter o nenê, mordeu decididamente o marido... e ficou resolvido. Não foi preciso curandeiro nenhum!
         Ao contrário dos índios, os maridos da sociedade tradicional africana, também por solidariedade, abstêm-se de toda relação sexual desde o começo da gravidez. E quando a esposa está a dar à luz, geralmente de cócoras, o marido deve sair de casa para que não ocorram influências mágicas perigosas. Caso sejam detectadas, devem ser imediatamente contrafeitas pelo curandeiro. Ao contrário do índio, que por solidariedade fica em casa, aquele tem que sair de casa por solidariedade à mulher.
         No Huambo, minha terra, as aldeias são o lugar onde a cultura tradicional está mais arraigada. Quando o parto é difícil ou trata-se de um caso extraordinário, deve intervir imediatamente a parteira tradicional ou os ginecólogos tradicionais. Nestes casos quase sempre se imputa a culpa ao marido. Crê-se que geralmente estes males são ocasionados pela infidelidade masculina.
         A infidelidade paterna é sempre considerada nefasta. Nestes casos, a parteira implora-lhe que se redima obrigando-o, na presença, a dizer todas as amantes que já teve, pelo menos na fase de gestação, para que desta feita se facilite o trabalho de parto e, por força da retratação do seu pai, o bebê nasça bem.
          Um amigo meu esteve também numa situação bem pouco confortável. A mulher estava com dificuldades no parto e a parteira mandou-o chamar para que ele dissesse o nome das suas amantes. Como a lista era enormissíma, uma das suas tias sugeriu que se fosse ao hospital, porque o infeliz nunca mais terminava com os nomes.
         No meu recente romance, lançado em novembro deste ano: “O dia em que um Ngola descobriu Portugal”, tentei exatamente retratar esse episódio com dois personagens principais do meu livro: Nganga Nzumba e Tchilombo:

         “... Algumas mulheres mais próximas da família real acercaram-se uma a uma do leito da rainha Tchilombo, e chorando aos soluços entenderam-lhe as mãos e garatiram-na com voz entrecortada que ela sobreviveria e daria um herdeiro ao rei, embora, também, fosse culpada pela dificuldade do parto por não se ter submetido, a partir do terceiro mês de gestação, a ritos purificatórios perante o adivinho.
    O rei Nganga Nzumba, manteve-se sentado numa cadeira ao lado do leito de sua esposa e, em tom amigo, disse-lhe com meiga censura:

         - Então, minha bem-amada! Tu, que fostes sempre a primeira, cada vez que era ocasião de servires o teu senhor e mestre, pela palavra e pelos actos, por que tardas o nascimento do nosso filho? Queres ser a única a negar-me o que as outras de bom grado e livremente me concederiam? Não entendes que é aí que está o futuro do nosso reino? Sei que queres saber quantas amantes eu já tive ou tenho! É isso? – Indagou Nganga Nzumba.
         Ela, porém, em sua dor silenciosa, lançava a cabeça para trás... Premiu compulsivamente suas mãos contra a barra da cama, enquanto ondas violentas de sangue se espalhavam nos lençóis, e então torceu o seu dolorido corpo, como se estivesse sendo vergastada!

         -Vou dizer-te todas amantes que já tive! – Prometeu Nzumba.


A lista era enorme e o infeliz genitor nunca mais terminava com os nomes de suas amantes... Entretanto, uma ex-escrava, que foi enfermeira de um senhor de engenho, fez o parto.
         O nasciturno de parto normal quase sempre dá sinais de vida com espirros e choros! Não foi o caso do primogênito de Nzumba e Tchilombo que nasceu com sinais de cansaço...  A parteira Nganguela preocupada com o caso pôs uma folha da árvore “Mumwe” sobre o peito da criança e tocou instrumentos de ferro. Com o som destes instrumentos, o bebê assustou-se e começou a chorar... Nzumba e Tchilombo choram juntos de plena felicidade! Doravante... Meu queridinho filho chamar-te-ei de Nzumbi e serás um grande guerreiro! – Vaticinou Nganga Nzumba”.

                   Um caso, porém, que pode ser considerado como exemplo extremo de solidariedade masculina. É um episódio inédito que se passou no interior do Brasil.
         Na casa de uma família cabocla, havia três compartimentos: dois quartos, intermediados por uma sala.  Uma parturiente estava num quarto a ter o bebê. Um dos pulsos tinha amarrado um cordel, o qual, subindo e passado por sobre os caibros, ia ter no quarto vizinho. Aí descia e tinha a outra ponta amarrada... adivinhem? ... Lá mesmo, nos penduricalhos do marido. Conforme doía, a mulher puxava espasmodicamente o cordel e assim o marido sofria também... Nos dois lados era um berreiro dos diabos.

         Haverá melhor exemplo de solidariedade masculina?

Oxalá que a moda não pegue em Angola, senão estamos todos fritos...


  

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

A Funjada na Casa da Prima Madalena

Enviar por Email Publicado: 8/11/2010 | Por: João Portelinha d´Angola | Em: ColunasCrónicasOpinião | Lido 84 Vezes

Por João Portelinha d´Angola 
João Portelinha d´Angola é escritor e poeta Angolano, formado em Direito e é professor universitário. 
Autor do Coluna, "Angolensis Mirabilis" no Zwela Angola.


É da praxe em todos os fins de semana juntarmo-nos em casa de algum familiar ou amigo para uma funjada.

Naquele dia era a vez, felizmente, de irmos a casa da Madalena – para nós prima Kuidukuta, por ser bem gorda, fofinha era como ela gostava que a chamassem.

Tinhamo-nos acomodado já à volta de uma enorme mesa de madeira tacula e aguardávamos impacientes pelos quitutes da prima fofinha.

Esses nossos repastos de fim de semana são bem fartos e sempre regados com bom vinho e muita cerveja. Há quem diga, e com razão, que nós angolanos vivemos em função do fim de semana. É comum, inclusive, fazermos perguntas do gênero como vai ser o teu fim semana? Ou simplesmente como é o fim de semana?

Mas as funjadas da prima fofinha são bem diferentes... Ora pela qualidade, ora pela diversidade. É de facto um regalo para os olhos de qualquer de qualquer um. Nunca faltam: a muambaKixiluanje, a kibeba assada, o kivúdia, o mufete, o sumate com jindungo Kahombó e o pirão do Huambo, que é de milho e que faço questão que nunca me falte. Em fim, um autêntico banquete para Kalú nenhum botar defeito.

Tive o privilégio de estar assentado ao lado do Zé Ivo, marido da fofinha numa das extremidades da mesa. Privilégio, quer dizer, até ver... Este, ao contrário da esposa, é um frangote, um xihuahua, embora muito simpático. É conhecido pelos amigos por Tchikuamanga (espécie de pássaro), por causa do seu nariz adunco.

Para além da tenaz fome que tínhamos, havia outra cumplicidade entre nós, os convivas: o de sabermos que aconteceria algo quando prima fofinha irrompesse daquela porta da cozinha; para além das panelas do esperado pitéu. Porque ela dissera-nos amiudadas vezes que teria uma grande surpresa reservada para nós.

E naquele momento surge a anfitriã com tudo a que tínhamos direito. Serviu, pelo menos a primeira rodada, como é d`hábito, as outras ficarem por nossa conta. Quando foi a vez do Zé, seu marido, encheu o prato de funji até ele não poder ver o parceiro ao lado...

Retirando o braço o braço dela, bruscamente disse: 

Leninha, não achas que é um exagero? – Lamentou-se o Zé todo envergonhado.

E ela:

Não tenho nada a ver com isso. Come Zé, se não vais ver o que te vai acontecer! – ameaçou.

O Zé olhava tristemente para nós, como pedindo socorro.

- Fofinha, deixa o rapaz “à la vonté”- disse-lhe sorrindo.

Não, João, esse gajo tem que comer tudo... TUDO MESMO!!!

Para nossa admiração, as súplicas e as lágrimas deste infeliz marido não eram suficientes para sensibilizar a esposa revoltada, que insistia em vê-lo comer todo aquele desproposito de comida.

Ó Madalena, dessas coisas mesmú... é qui eu... não gostú !!! - Suplicou ele numa forma interiorana, que lhe é peculiar.

A gargalhada não se fez espera, acompanhada, como é óbvio, de olhares entre os presentes. È que, sem querermos, estávamos a comparar o tamanho colossal da |Madalena que podia zanvular (dar uma boa surra) a qualquer um de nós e a pequenez do infeliz, cena que mais parecia a de David e Golias...

Kufungou, muxuxou bué, katé jifetou, mas a verdade é que não sei o Zé Ivo pancou (comeu), todo aquele pitéu. Entendemos depois que ele tinha o mau hábito de almoçar em casa da amante aos fins de semana alegando que passava fome em sua casa! Pode? Prima Madalena soube disso e quis castigá-lo assim... de uma forma bastante exemplar. Como se não bastasse, fez-lhe lembrar, ainda, que da próxima vez poria muito jindungo (pimenta) na comida dele para ficar mais esperto... Aí sim, para além de dançar fandango, certamente ficaria com os muzumbos como se fossem mordidos por um enxame de marimbondos! hahahhahahh

Nós é que não precisamos que ninguém nos obrigasse a pitar. Porque, para nós, comer não era castigo, mas sim prazer. Nem é preciso dizer que pancamos buelélé e até bisamos. Sempre, ao som de uma boa Kizomba... Pessoa que é da banda é assim mesmo... Panca bué e torra búe, principalmente quando há um bom vinho. E agora que estamos em paz, então imagina só!

Se quiserem saber como se come a feijoada made in Angola – é sem camisa! Perguntem só ao meu kota Hingo, general, se eu não estou a falar a verdade. 

E quanto ao nosso amigo Zé Ivo. “Vamos fazer mas como? Se é o problema que estamos com ele”!!!

Até a próxima funjada na casa da prima Madalena que zanvula bué mas também come-se bué! Vamos fazer mas como?

Laripó Kuví

João Portelinha d´Angola é escritor e poeta Angolano, formado em Direito e é professor universitário. Ele é autor de vários livros. O seu mais recente livro é "O DIA QUE UM NGOLA DESCOBRIU PORTUGAL". Autor da Coluna, "Angolensis Mirabilis" no Zwela Angola. Visite o seu Blog João Portelinha d´Angola.
 

Wikiliquidação do Império?

 

A divulgação de centenas de milhares de documentos confidenciais, diplomáticos e militares, pela Wikileaks acrescenta uma nova dimensão ao aprofundamento contraditório da globalização. A revelação, num curto período, não só de documentação que se sabia existir mas a que durante muito tempo foi negado o acesso público por parte de quem a detinha, como também de documentação que ninguém sonhava existir, dramatiza os efeitos da revolução das tecnologias de informação (RTI) e obriga a repensar a natureza dos poderes globais que nos (des)governam e as resistências que os podem desafiar. O questionamento deve ser tão profundo que incluirá a própria Wikileaks: é que nem tudo é transparente na orgia de transparência que a Wikileaks nos oferece.
A revelação é tão impressionante pela tecnologia como pelo conteúdo. A título de exemplo, ouvimos horrorizados este diálogo – Good shooting. Thank you–enquanto caem por terra jornalistas da Reuters e crianças a caminho do colégio, ou seja, enquanto se cometem crimes contra a humanidade. Ficamos a saber que o Irão é consensualmente uma ameaça nuclear para os seus vizinhos e que, portanto, está apenas por decidir quem vai atacar primeiro, se os EUA ou Israel. Que a grande multinacional famacêutica, Pfizer, com a conivência da embaixada dos EUA na Nigéria, procurou fazer chantagem com o Procurador-Geral deste país para evitar pagar indemnizações pelo uso experimental indevido de drogas que mataram crianças. Que os EUA fizeram pressões ilegítimas sobre países pobres para os obrigar a assinar a declaração não oficial da Conferência da Mudança Climática de Dezembro passado em Copenhaga, de modo a poderem continuar a dominar o mundo com base na poluição causada pela economia do petróleo barato. Que Moçambique não é um Estado-narco totalmente corrupto mas pode correr o risco de o vir a ser. Que no “plano de pacificação das favelas” do Rio de Janeiro se está a aplicar a doutrina da contra-insurgência desenhada pelos EUA para o Iraque e Afeganistão, ou seja, que se estão a usar contra um “inimigo interno” as tácticas usadas contra um “inimigo externo”. Que o irmão do “salvador” do Afeganistão, Hamid Karzai, é um importante traficante de ópio. Etc., etc, num quarto de milhão de documentos.
Irá o mundo mudar depois destas revelações? A questão é saber qual das globalizações em confronto — a globalização hegemónica do capitalismo ou a globalização contra-hegemónica dos movimentos sociais em luta por um outro mundo possível — irá beneficiar mais com as fugas de informação. É previsível que o poder imperial dos EUA aprenda mais rapidamente as lições da Wikileaks que os movimentos e partidos que se lhe opõem em diferentes partes do mundo. Está já em marcha uma nova onda de direito penal imperial, leis “anti-terroristas” para tentar dissuadir os diferentes “piratas” informáticos (hackers), bem como novas técnicas para tornar o poder wikiseguro. Mas, à primeira vista, a Wikileaks tem maior potencial para favorecer as forças democráticas e anti-capitalistas. Para que esse potencial se concretize são necessárias duas condições: processar o novo conhecimento adequadamente e transformá-lo em novas razões para mobilização.
Quanto à primeira condição, já sabíamos que os poderes políticos e económicos globais mentem quando fazem apelos aos direitos humanos e à democracia, pois que o seu objectivo exclusivo é consolidar o domínio que têm sobre as nossas vidas, não hesitando em usar, para isso, os métodos fascistas mais violentos. Tudo está a ser comprovado, e muito para além do que os mais avisados poderiam admitir. O maior conhecimento cria exigências novas de análise e de divulgação. Em primeiro lugar, é necessário dar a conhecer a distância que existe entre a autenticidade dos documentos e veracidade do que afirmam. Por exemplo, que o Irão seja uma ameaça nuclear só é “verdade” para os maus diplomatas que, ao contrário dos bons, informam os seus governos sobre o que estes gostam de ouvir e não sobre a realidade dos factos. Do mesmo modo, que a táctica norte-americana da contra-insurgência esteja a ser usada nas favelas é opinião do Consulado Geral dos EUA no Rio. Compete aos cidadãos interpelar o governo nacional, estadual e municipal sobre a veracidade desta opinião. Tal como compete aos tribunais moçambicanos averiguar a alegada corrupção no país. O importante é sabermos divulgar que muitas das decisões de que pode resultar a morte de milhares de pessoas e o sofrimento de milhões são tomadas com base em mentiras e criar a revolta organizada contra tal estado de coisas.
Ainda no domínio do processamento do conhecimento, será cada vez mais crucial fazermos o que chamo uma sociologia das ausências: o que não é divulgado quando aparentemente tudo é divulgado. Por exemplo, resulta muito estranho que Israel, um dos países que mais poderia temer as revelações devido às atrocidades que tem cometido contra o povo palestiniano, esteja tão ausente dos documentos confidenciais. Há a suspeita fundada de que foram eliminados por acordo entre Israel e Julian Assange. Isto significa que vamos precisar de uma Wikileaks alternativa ainda mais transparente. Talvez já esteja em curso a sua criação.
A segunda condição (novas razões e motivações para a mobilização) é ainda mais exigente. Será necessário estabelecer uma articulação orgânica entre o fenómeno Wikileaks e os movimentos e partidos de esquerda até agora pouco inclinados a explorar as novas possibilidades criadas pela RTI. Essa articulação vai criar a maior disponibilidade para que seja revelada informação que particularmente interessa às forças democráticas anti-capitalistas. Por outro lado, será necessário que essa articulação seja feita com o Foro Social Mundial (FSM) e com os media alternativos que o integram. Curiosamente, o FSM foi a primeira novidade emancipatória da primeira década do século e a Wikileaks, se for aproveitada, pode ser a primeira novidade da segunda década. Para que a articulação se realize é necessária muita reflexão inter-movimentos que permita identificar os desígnios mais insidiosos e agressivos do imperialismo e do fascismo social globalizado, bem como as suas insuspeitadas debilidades a nível nacional, regional e global. É preciso criar uma nova energia mobilizadora a partir da verificação aparentemente contraditória de que o poder capitalista global é simultaneamente mais esmagador do que pensamos e mais frágil do que o que podemos deduzir linearmente da sua força. O FSM, que se reúne em Fevereiro próximo em Dakar, está precisar de renovar-se e fortalecer-se, e esta pode ser uma via para que tal ocorra. 


16-12-2010    Visão
  

Boaventura de Sousa Santos

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Boaventura de Sousa Santos e os ‘espelhos estranhos'

   
A bolsa atribuída a Boaventura de Sousa Santos (BSS) pelo European Research Council representa sem dúvida um ponto alto na carreira do decano dos sociólogos portugueses, recentemente jubilado. Os “espelhos estranhos” (ALICE – espelhos estranhos, lições imprevistas, é o título do projecto que mereceu esta bolsa) são uma boa metáfora, não só para exprimir a relação da Europa com o mundo, mas também para ilustrar a indiferença – ou o despeito – com que a comunidade sociológica portuguesa (pelo menos uma parte dela) olha para a projecção internacional de BSS e da sua obra.

A afirmação do Centro de Estudos Sociais (CES) na segunda metade dos anos oitenta constituiu, à imagem do seu principal dirigente, um núcleo de sociólogos potencialmente concorrente com a “escola de Lisboa” (ISCTE e ICS), até porque, desde o início, se impôs como um centro interdisciplinar que assumiu a sociologia crítica e o pensamento marxista e pós-marxista como referências importantes, apostando no estudo da sociedade portuguesa enquanto “semiperiferia” do sistema mundial, no quadro das suas relações históricas com a Europa, de um lado, e o Brasil e as antigas colónias africanas, de outro.

O CES cresceu e angariou prestígio, sendo hoje um dos dois centros de excelência nas ciências sociais portuguesas com o estatuto de Laboratório Associado do Estado. A sua composição é, de resto, muito heterogénea, tornando abusiva qualquer tentativa de reduzir o centro à actividade do seu líder. O prestígio de BSS prestigia também o CES, e o prestígio de ambos prestigia a sociologia portuguesa. Seria bom que esta verdade vingasse. E que a Associação Portuguesa de Sociologia (de que BSS é membro fundador) começasse por dar a este assunto a visibilidade que ele merece.

Com uma impressionante produção teórica nos últimos vinte anos, e estimulando uma intensa actividade de extensão, quer na formação avançada de sectores profissionais (por exemplo na área da justiça), quer no activismo cívico e político (por exemplo no âmbito do Fórum Social Mundial), BSS ganhou visibilidade e passou a ser lido, estudado e debatido em inúmeras universidades e entre activistas de movimentos sociais do mundo inteiro, em especial na América Latina. Projectos internacionais como «Reinventar a Emancipação Social» ou a sua reflexão sobre a «epistemologia do Sul» deram expressão a uma critica radical do capitalismo global, prenunciando a crise que hoje vivemos e o colapso do neoliberalismo. Isto, naturalmente, tem acicatado a concorrência de alguns sectores da comunidade académica lisboeta (em especial do ISCTE, o bastião da “sociologia pura”, sempre mais alinhada com o poder instituído), que, embora demonstrem respeito pelo “sociólogo do direito”, pretendem ignorar a dimensão da obra de BSS e, nos bastidores, acusam-no de ser normativo e messiânico.

"Eppur si muove"... O projecto “Espelhos Estranhos” pode significar um passo libertador que a Europa poderá vir a abraçar. Inverter a lógica dominante e olhar o mundo da periferia para o centro; descobrir nas margens e nos seus saberes – até aqui oprimidos – novas experiências e modos de organização da vida social e económica; sair do seu núcleo hegemónico e ver-se no espelho dos antigos povos colonizados; são caminhos que se podem apresentar no século XXI à velha Europa como passos para um novo e mais rico conhecimento de si mesma, para uma nova e mais promissora relação com os mundos por si encobertos ou descobertos ao longo do seu processo civilizacional.

Pode ser apenas um começo que lhe permita olhar para fora sem arrogância e olhar para si própria a partir de fora, superando os traumas do passado. Não sabemos se esta será a fórmula para a democratização da democracia. Mas ao reconhecer o pensamento crítico de BSS, a Europa dá provas de querer reinventar-se como berço do multiculturalismo cosmopolita e vanguarda do pensamento emancipatório.


Elísio Estanque




 

Boaventura de Sousa Santos distinguido com “accesit” pela Fundação Xavier de Salas (Espanha)

  
Boaventura de Sousa Santos distinguido com “accesit” pela Fundação Xavier de Salas (Espanha)

 

A Fundación Xavier de Salas, em Espanha, atribuiu a Boaventura de Sousa Santos um “accesit” do prémio da instituição que reconhece anualmente entidades ou personalidades que se distinguem pelo seu contributo para o desenvolvimento cultural, social e científico no universo ibero-americano.
O “Premio Fundación Xavier de Salas” é uma das iniciativas que a fundação leva a cabo, em parceria com o Ministério da Cultura de Espanha, de modo a reconhecer o mérito de uma pessoa, instituição ou personalidades que tendo realizado uma obra relevante e vasta em prol do desenvolvimento cultural, social e científico, constituem-se como referência na sua área de investigação, especialmente no panorama ibero-americano.
A Fundação Xavier de Salas justifica a atribuição do galardão a Boaventura de Sousa Santos com a relevância do seu percurso como investigador e docente e, ainda, com o inestimável valor da sua obra publicada no espaço ibero-americano.
A Fundacão Xavier de Salas, criada em 1981, dedica-se ao estudo das relações entre a Península Ibérica, particularmente a Extremadura, e a América, respondendo este propósito à consciência da importância das ditas relações. É também objectivo da fundação incrementar a investigação avançada a nível sociológico, histórico e antropológico.
Boaventura de Sousa Santos, Doutorado pela Universidade de Yale (JSD, 1973), é Professor Catedrático jubilado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Distinguished Legal Scholar da Universidade de Wisconsin-Madison (EUA) e Global Legal Scholar da Universidade de Warwick (UK). É Director do Centro de Estudos Sociais (onde dirige, igualmente, o Observatório Permanente da Justiça Portuguesa) e do Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra. A sua carreira estende-se por 4 décadas, afirmando-se como um dos cientistas sociais portugueses com maior projecção internacional. Recentemente, foi-lhe atribuída uma Advanced Grant, pelo European Research Council, para desenvolver um projecto de investigação, entre 2011 e 2016, com um apoio de 2,4 milhões de euros, com o título “ALICE - Espelhos estranhos, lições imprevistas: definindo para a Europa um novo modo de partilhar as experiências do mundo”. 

  

O European Research Council atribuiu uma Advanced Grant a Boaventura de Sousa Santos

O European Research Council atribuiu uma Advanced Grant a Boaventura de Sousa Santos para desenvolver um projecto de investigação nos próximos 5 anos. As Advanced Grants são das mais prestigiosas bolsas internacionais, tendo sido ganha após a participação em concursos extremamente competitivos.Esta bolsa tem o valorde 2,4 milhões de euros, para a realização do projecto de investigação“ALICE - Espelhos estranhos, lições imprevistas: definindo para a Europa um novo modo de partilhar as experiências do mundo”, a desenvolver no Centro de Estudos Sociais (www.ces.uc.pt) da Universidade de Coimbra. Esta bolsa, que financia, com o apoio da União Europeia, a investigação de ponta no espaço europeu, tem sido raramente atribuída a cientistas portugueses, sendo esta a primeira vez que é atribuída a um cientista social.
O European Research Council (http://erc.europa.eu/), cuja representação portuguesa está a cargo da astrónoma Teresa Lago, é a primeira instituição europeia a financiar investigação de fronteira e tem como objectivo estimular a excelência científica e encorajar os melhores investigadores, nas diversas áreas científicas, a desenvolver investigação de risco de forma transdisciplinar.O ERC financia, anualmente, Advanced Grants, para investigadores experientes, e Starting Grants, para jovens doutorados.
O objectivo do projecto é desenvolver um novo paradigma teórico para a Europa contemporânea, baseado em duas ideias principais: o conhecimento do mundo excede em muito o modo como a Europa o vê; a transformação social, política e institucional da Europa beneficiará bastante com a compreensão das inovações que estão a ocorrer em muitos países e regiões com quem a Europa tem, cada vez mais, relações de interdependência.
A concretização deste projecto desenvolver-se-á em quatro tópicos principais: a democratização da democracia; o constitucionalismo intercultural; as outras economias; e os direitos humanos (com especial incidência no direito à saúde). Os quatro tópicos estão interrelacionados e são concebidos como dimensões cruciais para a transformação social. A investigação desenvolver-se-á, de forma articulada, em países portadores de experiências relevantes para estudar os quatro tópicos identificados, nomeadamente: Bolívia, Brasil, Equador, Índia, África do Sul, França, Itália, Reino Unido e Portugal.
Os resultados expectáveis, para além de um conjunto diversificado de publicações (livros e artigos científicos), comunicações e de eventos científicos, são os seguintes: recomendações e documentos orientados, a nível nacional e europeu, para as instituições políticas; relatórios executivos, com os principais objectivos e conclusões; materiais didácticos para integração em programas universitários; entre outros. Todos os resultados do projecto serão divulgados online e disponibilizados a todos os públicos.
Realce, ainda, para a constituição de uma equipa que contempla 4 investigadores doutorados e 8 investigadores em doutoramento, que terão neste projecto um espaço de reflexão, afirmação e produção inigualável, promovendo a criação de equipas de alto nível, com uma perspectiva de integração científica e política à escala global.
Nos dias de hoje, em que sofremos com os efeitos de uma turbulência financeira e económica, derivada de opções políticas definidas nas últimas décadas, é clara a necessidade de que os processos de aquisição de conhecimentos devem ter um carácter recíproco, numa troca partilhada que a todos beneficie. Neste projecto, assume-se esta perspectiva como um objectivo político: sustentar novas medidas políticas e sociais tendo em consideração as realidades e as novas formas de vida emergentes na Europa e fora dela. Iniciar um diálogo aprofundado entre diversas experiências a decorrer no mundo, no que Boaventura de Sousa Santos vem designando como “ecologia dos saberes”, ou seja, o reconhecimento da pluralidade de conhecimentos existentes no mundo, como forma de dotar a Europa de novos instrumentos para construir um futuro melhor.
Boaventura de Sousa Santos, Doutorado pela Universidade de Yale (JSD, 1973), é Professor Catedrático jubilado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Distinguished Legal Scholar da Universidade de Wisconsin-Madison e Global Legal Scholar da Universidade de Warwick. É Director do Centro de Estudos Sociais (onde dirige, igualmente, o Observatório Permanente da Justiça Portuguesa) e do Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra. A sua carreira estende-se por 4 décadas, afirmando-se como um dos cientistas sociais portugueses com maior projecção internacional, onde tem vindo a coordenar um elevado número de projectos, afirmado uma vasta gama de publicações, orientado um enorme número de jovens cientistas e contribuído para a afirmação das ciências sociais como uma parceira relevante para a reflexão e elaboração de políticas públicas. 

  

domingo, 28 de novembro de 2010

 Relato da escravidão em romance de João Portelinha

05:07
Um romance histórico que mistura ficção e realidade, assim define o autor do livro O Dia que um Ngola Descobriu Portugal, o professor João Rodrigues Portelinha da Silva. O livro tem como tema central o relato da escravidão em Angola e no Brasil, sendo a personagem central a formosa e lendária rainha Njinga Mbandi e o Nganga Nzumba (Zumbi dos Palmares), que, na ficção, são mãe e filho, mas que na realidade, embora não sejam, viveram na mesma época e têm a mesma origem. Herança cultural No livro, o autor comenta que tentou ilustrar a relação forte existente entre os povos angolanos e brasileiros. “Angola é a mãe preta que amamentou culturalmente o Brasil e o colocou ao colo através das mucamas”, diz o escritor. Portelinha revela que a obra é fruto de um projeto que o acompanhava desde a juventude. “Sonhava em ter um navio e nele colocar todas as pessoas provenientes de países que foram colonizados por Portugal. Levaria-os até Portugal e lá diria que essas pessoas teriam descoberto Portugal.” Ele conta que desde o começo da obra teve ambição de reproduzir com realismo o que foi o comércio de escravos da maneira mais verídica e completa, buscando evitar banalidades. A obra, segundo ele, é feita de observação puramente naturalista, com uma ampla parte psicológica das ações, bem como sentimentos dos personagens que retratou. O lançamento do livro O Dia que um Ngola Descobriu Portugal ocorreu na última segunda-feira, no Anfiteatro do Campus da Universidade Federal do Tocantins (UFT), em Palmas. Segundo Portelinha, o livro também foi lançado no início deste mês, no Clube Naval e das Nações, em Brasília, com a presença do corpo diplomático creditado no Brasil. Escritor Formado em Direito pela Universidade Antônio Agostinho Neto em Angola (primeira turma formada pós-independência) e em Ciências Políticas pelo Instituto Wilhelm Pieck - Berlim, João Rodrigues Portelinha da Silva possui mestrado em Filosofia do Direito pela Academia de Ciências Sociais, Sofia - Bulgária. Doutorado em Sociologia do Estado e Sociedade pela UnB - Universidade Nacional de Brasília. Entre outros vários títulos que acumula, ele teve uma experiência expressiva na África. Foi chefe do ATM do Governo Provincial do Huambo, diretor Jurídico do Comissariado Provincial do Huambo, docente da Escola Nac. do Partido, chefe de Cátedra de Ciências Sociais da Pré-Academia Militar do Huambo. É presidente da Associação dos Naturais e Amigos da África em Palmas, Brasil. É membro da Associação dos Naturais e Amigos de Angola no Brasil e presidente da Academia Palmense de Letras. Além disso, tem vários livros e ensaios publicados de Literatura, Direito, Ciência Política, História e Sociologia Jurídica. Tem atuado, também, como analista político em programas na TV e jornais locais e nacionais.


Fonte: Jornal do Tocantins

Autor: Redação

sábado, 27 de novembro de 2010

Lançamento do meu livro na UFT





Múcio e Portelinha


Wilson  e Portelinha



Alan, reitor da UFT e Portelinha



Portelinha


Portelinha e Osmar Casagrande

Kleice, minha esposa e eu



segunda-feira, 22 de novembro de 2010

PORTELINHA LANÇA LIVRO NA UFT

Mesa-redonda discutirá política pública para quilombolas e cotas na UFTImprimirE-mail
Por Samuel Lima e José Filho   
22 de novembro de 2010
Hoje a noite, no Anfiteatro do Campus da UFT em Palmas, ocorrerá um mesa-redonda que abordará "Políticas Públicas para a população quilombola e cotas na UFT". O evento começa às 19h30 e deverá contar com a presença do reitor Alan Barbiero, e do subsecretário de Ações Afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), João Carlos Nogueira; o professor Élson Santos (UFT) mediará a mesa-redonda.
O evento faz parte da programação do Seminário da Consciência Negra: fórum de políticas públicas, iniciado no último dia 19 e que trata de diversos assuntos, indo da História da África; Políticas públicas para quilombolas e cotas; até Educação, Raça e Sexualidade e Dimensionamentos de Sociabilidades Negras no Brasil Contemporâneo. A programação prossegue até 25 de novembro, nos campi da Universidade Federal do Tocantins de Palmas e Porto Nacional, e ainda no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Tocantins (IFTO).
O Seminário acontece por ocasião das comemorações do Dia da Consciência Negra - celebrado em 20 de Novembro no Brasil. A data é dedicada à reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira. O Dia da Consciência Negra procura ser uma data para se lembrar a resistência do negro à escravidão de forma geral. O encontro é uma realização do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB/UFT) e conta com apoio do Comitê Estadual de Promoção da Igualdade Étnicorracial (Ceppir).

Acesse aqui a programação completa do Seminário da Consciência Negra.
imagem_do_livro.jpgLivro - Durante a programação desta segunda-feira (22), o professor João Rodrigues Portelinha da Silva, do colegiado de Direito, lançará o seu livro "O Dia que um Ngola Descobriu Portugal". O livro, um romance, tem como tema o relato da escravidão em Angola e no Brasil.

De acordo com a cantora, atriz, apresentadora e crítica de literatura angolana-brasileira, Helga Féti, o livro do professor Portelinha, como é conhecido na UFT, reproduz com realismo o que foi "o infame comércio de escravos, de maneira mais verídica e mais completa e nos mínimos detalhes, sem buscar evitar o que pudesse haver de banal ou mesmo de desagradável em tudo quanto lhe impressionara sobre a escravidão do seu continente e das duas terras que ama de paixão: Angola, a mãe preta, e o Brasil, seu filho mestiço", diz. Na ocasião, o livro será apresentado pelo poeta e Vice- presidente da Academia Palmense de Letras. Osmar Casagrande.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010







A CPLP vista de África

Os países africanos têm hoje um interesse acrescido em fortalecer as organizações internacionais em que participam


23:59 Quarta feira, 28 de Jul de 2010
A CPLP é constituída predominantemente por países africanos. Não admira que nela dominem as dinâmicas políticas africanas, regionais, e que sejam estas a condicionar as relações com países como Portugal e o Brasil. O regionalismo africano é hoje muito diversificado e intenso e é herdeiro de duas tradições: o pan-africanismo e o colonialismo. Há, por um lado, a União Africana e várias organizações regionais das quais as principais são a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), a Comunidade Económica dos Estados da África Central (CEEAC), a Comunidade Económica dos Estados da África Austral (SADC), a Comunidade da África Oriental (EAC); e há, por outro lado, as organizações que decorrem do colonialismo e dos laços neocoloniais que se procuraram manter depois das independências: a Commonwealth, a Francofonia e a CPLP.
De todas elas, a CPLP é aquela em que os países africanos têm, por agora, mais capacidade de manobra pelo facto de o fraco desenvolvimento de Portugal e a guerra de libertação não terem permitido à antiga potência colonial controlar os processos de desenvolvimento pós-independência. Isto não significa que os laços neocoloniais não possam vir a surgir, quer protagonizados por Portugal quer pelo Brasil (que foi colonizado, não colonizador, outra originalidade da CPLP).
As organizações de origem neocolonial são vistas pelos países africanos com uma forte dose de pragmatismo. Daí que Moçambique seja membro de pleno direito da Commonwealth e observador da Francofonia e Cabo Verde, a Guiné-Bissau e São Tome e Príncipe sejam membros de pleno direito da Francofonia. Arvorar a prevalência linguística, as tradições culturais ou os valores de Direitos Humanos em critérios definidores de pertença a estas organizações faz muito pouco sentido à luz do que tem sido a lógica da sua evolução.
Quando qualquer destes critérios é acionado ele revela uma de duas coisas. Ou é usado para disfarçar as verdadeiras motivações: a expulsão do Zimbabwe da Commonwealth por violar os Direitos Humanos, quando o verdadeiro 'crime' foi o de expropriar os agricultores brancos, descendentes dos colonos. Ou é usado tão seletivamente que, no mínimo, revela hipocrisia. Se, com olhar desapaixonado, observarmos o que se passa nos países da CPLP (e não me refiro exclusivamente aos africanos) não temos grandes razões para triunfalismo e, perante isso, a opção é entre a incoerência ou a arrogância de reclamarmos o privilégio de definir a norma: aos filhos legítimos da CPLP permitimos tudo, aos filhos adotivos exigimos que cumpram a lei e os princípios.
Os países africanos têm hoje um interesse acrescido em fortalecer as organizações internacionais em que participam e em maximizar as valências que elas oferecem (Portugal e o acesso à EU; o Brasil e o acesso aos países emergentes). São várias as razões. África confronta-se com um problema de segurança que em larga medida é importado e que, paradoxalmente, é causado por quem lho pretende resolver: a criação, em 2007, do Africom, o Comando militar dos EUA para a África, por enquanto sediado fora de África.
 Na aparência vocacionado para combater o fundamentalismo islâmico e apoiar as missões de paz, o Africom visa garantir o acesso dos EUA aos recursos naturais estratégicos do continente (petróleo, bauxite, urânio, aquíferos) ante a eventual ameaça da China. Faz prever mais instabilidade política e uma corrida aos armamentos (tal como está a acontecer na América Latina), o que será fatal para países a braços com carências sociais elementares. Um multilateralismo alternativo pode ser uma salvaguarda.

A segunda razão prende-se com a invisibilidade do sofrimento das populações africanas e a necessidade de lhe pôr fim. Ressentem os africanos que tanta atenção mundial seja dada ao derrame do petróleo no golfo do México quando a destruição ambiental do delta do Níger, muitas vezes mais grave e em resultado de décadas de criminosa negligência, não suscite interesse mediático.

TEXTO DA REVISTA VISÃO-PORTUGAL